Um pouco de Nietzsche – pílula filosófica
1
– Apresentação
Friedrich
Nietzsche (1844-1900) foi um filósofo alemão do século XIX que desenvolveu uma
filosofia única e provocadora. Seu pensamento aborda temas como a verdade, a
moral, a religião, a vida e a morte. Ele acreditava que a moral e a religião
tradicionais tinham se tornado opressivas e limitantes para a humanidade, e
buscou criar uma nova forma de pensar que valorizasse a individualidade e a
vontade de poder. Alguns dos seus conceitos mais conhecidos incluem o
"Übermensch" (Além-do-Homem), a crítica à moral cristã, e a ideia de
"eterno retorno".
Há
de se dizer, para a boa compreensão de seu pensamento, algo sobre o aforismo e
seu papel na sua filosofia!
O
aforismo é uma forma de escrita filosófica que consiste em frases curtas,
concisas e poéticas que transmitem uma ideia profunda. Nietzsche utilizou o
aforismo em sua obra para expressar suas ideias de forma sucinta e impactante,
de modo a estimular o pensamento crítico do leitor e ajudá-lo a compreender sua
filosofia. Além disso, o aforismo é uma forma de escrita que permite a
Nietzsche expressar suas ideias de forma livre e não linear, o que reflete a
natureza fragmentada e múltipla do pensamento filosófico. Em sua obra,
Nietzsche aborda temas como a moral, a cultura, a religião, a arte, a vontade
de potência e a decadência da humanidade. O uso de aforismos por Nietzsche
reflete sua preocupação com a linguagem e a comunicação efetiva da filosofia.
2
– Principais conceitos
Seu
legado inclui uma ampla gama de conceitos e ideias, algumas das quais são ainda
debatidas e influentes hoje. Neste artigo, exploraremos algumas dessas
ideias-chave.
Apolíneo
e Dionisíaco:
Nietzsche
distingue entre dois arquétipos que representam dois modos opostos de ser
humano: o Apolíneo e o Dionisíaco. O Apolíneo é o princípio da razão, da ordem
e da claridade [ou princípio de individuação]. Representa a busca da beleza e
da perfeição. Já o Dionisíaco é o princípio da paixão, do instinto e da emoção.
Representa a fúria criativa, o prazer da vida e a sensualidade. Nietzsche
argumenta que a arte, a religião e a cultura são resultadas da interação entre
esses dois arquétipos.
Amor
Fatum:
Nietzsche
reitera a ideia de "amor fati", ou amor pelo destino. Isso significa
que, em vez de lutarmos contra o destino, devemos amá-lo e aceitá-lo, pois tudo
que acontece é necessário e faz parte de uma grande ordem. Nesta vertente, o
pessimismo é superado e a vida é vista como uma aventura fascinante, cheia de
possibilidades e desafios.
Eterno
Retorno:
Outra
ideia central de Nietzsche é o "eterno retorno". Ele argumenta que
tudo o que já aconteceu, acontecerá novamente, eternamente. Isso significa que,
apesar das aparências, a vida é uma repetição infinita de eventos, e que
devemos abraçar esse fato e viver plenamente cada momento, pois ele está
destinado a ser repetido.
Decadência:
Nietzsche
vê a civilização ocidental como decadente, devido ao que ele chama de
"síndrome de esgotamento". Ele argumenta que a moralidade cristã, a
ética e o positivismo científico são expressões de uma cultura que perdeu sua
vitalidade e virou-se para a negação da vida. Ele propõe que a solução para
essa decadência é a superação da moral cristã e a criação de uma nova
moralidade, baseada em valores diferentes.
Moral
do Rebanho:
A
moral de rebanho, segundo Nietzsche, é a moral herdada das massas e imposta por
instituições como a igreja, a política e a família. Esta moral é baseada em
valores como a compaixão, a igualdade, a humildade e a submissão, que segundo
Nietzsche são valores dos fracos e não dos fortes. A moral de rebanho é vista
por Nietzsche como uma forma de controle e opressão dos fortes pelos fracos, e
é um obstáculo para a realização da vontade de potência — o desejo de
crescimento e superação — da humanidade.
Vontade
de Potência:
Ele
descreve a Vontade de Potência como uma força vital que impulsiona a vida a
buscar aumentar sua potência e realizar seus desejos. Essa vontade não se
limita apenas ao ser humano, mas é uma força presente em todas as coisas vivas
na natureza.
Nietzsche
acredita que a Vontade de Potência é a fonte da criatividade, da arte e da
cultura, e que é a responsável pela evolução e desenvolvimento da vida. Ele
argumenta que a Vontade de Potência é a força que guia a busca humana por
conhecimento, realização e felicidade.
3
– Sua crítica ao platonismo
Friedrich
Nietzsche criticou duramente a filosofia platônica e o pensamento metafísico da
Grécia antiga, argumentando que estes se concentravam demais na busca de
verdades universais e eternas, negando a realidade concreta da vida. Para
Nietzsche, a teoria das Formas Eternas de Platão, que propõe que existe um
mundo suprassensível de ideias eternas e perfeitas, é uma fuga da realidade e
uma negação da vida e de suas imperfeições [algo demasiado questionável pois o
horizonte de compreensão do pensamento platônico passa por outra via]. Além
disso, ele argumenta que o pensamento metafísico da Grécia antiga é decadente e
inerte, pois se concentra em conceitos abstratos ao invés de se concentrar na
realidade imediata da vida.
Nietzsche
tinha em mente ao criticar o pensamento platônico e metafísico a necessidade de
se concentrar na vida concreta e no mundo imediato, em vez de buscar verdades
eternas e universais. Ele acreditava que a filosofia precisava se voltar para a
vida e para a experiência individual, em vez de se concentrar em conceitos
abstratos e metafísicos. De acordo com sua filosofia, a vida é uma força vital
que precisa ser celebrada e valorizada, e não negada ou negociada. Ao criticar
Platão e o pensamento metafísico, Nietzsche buscava estimular a reflexão sobre
a importância da vida e da experiência individual na filosofia.
4
– Sua crítica ao cristianismo[1]
Friedrich
Nietzsche viu o cristianismo como uma religião opressiva e decadente que tinha
um impacto negativo na humanidade. Ele acreditava que a moral cristã, baseada
na submissão e na renúncia, era prejudicial à vontade de poder humana e
limitava a criatividade e a individualidade. Além disso, Nietzsche argumentou
que a religião cristã valorizava a morte e a sofrimento, o que ele considerava
uma forma de autodestruição.
Nietzsche
criticou também a concepção de Deus no cristianismo, argumentando que a crença
em um ser onipotente e onipresente era uma fraqueza da humanidade e uma falta
de coragem para enfrentar a realidade da vida e da morte. Em vez disso, ele
defendia a criação de uma nova moral e religião que valorizasse a vida e a
individualidade.
Em
resumo, Nietzsche via o cristianismo como um sistema de crenças decadente e
opressivo que precisava ser superado para a evolução da humanidade.
5
– Suas influências
Friedrich
Nietzsche é considerado um dos filósofos mais influentes e provocativos do
século XIX. Sua filosofia é uma crítica ácida à moral, religião e cultura
ocidental, e busca questionar a base da verdade e da realidade. A formação do
pensamento filosófico de Nietzsche foi influenciada por uma série de autores e
correntes filosóficas, incluindo:
Schopenhauer:
Arthur Schopenhauer foi um dos filósofos que mais influenciou Nietzsche. Ele
partilhava com Nietzsche a visão pessimista da vida e a crítica à razão
iluminista. Schopenhauer argumentava que a vida é governada por uma vontade
incontrolável e insaciável, que leva a sofrimento e insatisfação. Essa visão
influenciou a filosofia de Nietzsche sobre o tema da vontade de poder.
Friedrich
Schelling foi um filósofo alemão do século XIX, que desenvolveu uma teoria da
natureza e da realidade. Ele argumentava que o universo é governado por uma
força cósmica e divina, e que a verdade é conhecida apenas através da intuição.
Essas ideias influenciaram a filosofia de Nietzsche sobre a natureza da verdade
e do conhecimento.
Rousseau:
Jean-Jacques Rousseau foi um filósofo e escritor francês do século XVIII. Sua
crítica à sociedade civil e à moral convencional influenciou a filosofia de
Nietzsche, especialmente na questão da liberdade individual e do papel da
sociedade.
Sócrates:
Sócrates foi um filósofo grego do século V a.C., que é considerado um dos
fundadores da filosofia ocidental. Sua crítica às opiniões e à moral
convencional influenciou a filosofia de Nietzsche sobre a questão da verdade e
da moral.
Filosofia
Clássica: A filosofia clássica, incluindo Platão e Aristóteles, influenciou a
filosofia de Nietzsche em vários aspectos. Ele questionou a teoria platônica da
realidade e a concepção aristotélica da moral.
6 – Críticas ao pensamento de Nietzsche
As
críticas ao pensamento de Friedrich Nietzsche incluem:
Falta
de clareza: Alguns críticos argumentam que o estilo poético e fragmentário de
Nietzsche pode ser confuso e difícil de seguir.
Rejeição
da razão: Nietzsche é conhecido por sua crítica à razão e à lógica, o que levou
a críticas de que ele não fornece uma base sólida para suas ideias.
Natureza
supostamente misógina e racista de sua filosofia: Algumas de suas escritas
foram criticadas por seu conteúdo misógino e racista, o que tem levado a
acusações de que sua filosofia é moralmente questionável.
Uso
inadequado de sua filosofia: Nietzsche foi frequentemente mal interpretado e
sua filosofia foi utilizada de maneira inadequada para justificar ideologias
políticas e sociais perigosas, como o nazismo.
Falta
de sistematicidade: Alguns críticos argumentam que o pensamento de Nietzsche é
fragmentado e não forma uma visão coesa do mundo.
No
entanto, é importante destacar que essas críticas são frequentemente objeto de
debates filosóficos e não há consenso unânime sobre elas. Muitos filósofos e
pensadores ainda encontram valor e inspiração nas ideias de Nietzsche.
E
talvez o mais importante seja comentar algo a respeito de Bertrand Russell,
O
filósofo e matemático britânico [Russell], de fato, tinha uma visão negativa
sobre o pensamento de Nietzsche.
Em
sua obra, Russell afirma que Nietzsche era incapaz de amor e que sua moral era
perversa, e argumenta que ele tinha uma visão distorcida da vida e da
sociedade.
Russell
entendia a moral e a ética como algo que deveria ser baseado na compaixão e no
respeito pelo outro, e acreditava que a moral deveria ser utilizada para
promover o bem-estar e a felicidade das pessoas. Em sua opinião, a moral de
Nietzsche era perversa porque ele valorizava a força, a vontade de poder e o
individualismo acima da compaixão e do bem-estar dos outros.
Além
disso, Russell argumentava que Nietzsche tinha uma concepção distorcida da
realidade, e que sua filosofia era baseada em mitos e fantasias, em vez de
fatos concretos e verificáveis. Em sua opinião, a filosofia de Nietzsche era
uma espécie de niilismo, que negava a existência de valores e verdades
universais e que levava a uma vida vazia e sem sentido.
7 – Conclusão
Friedrich
Nietzsche foi um filósofo alemão, cujo pensamento revolucionou a filosofia e a
cultura ocidental. Ele é conhecido por sua crítica à moral cristã, à democracia
e ao humanismo, além de sua defesa da vontade de poder e do individualismo.
De
acordo com especialistas, por exemplo, Oswaldo Giacóia Jr., Nietzsche vê a
moral como algo criado pelo homem, e não como uma verdade absoluta, e por isso,
acredita que o indivíduo deve ser livre para criar sua própria moral e sua
própria vida, sem ser governado por padrões sociais. Ele também argumenta que a
democracia e o humanismo são ideais fracos, e que a verdadeira liberdade só
pode ser alcançada através da vontade de poder e do individualismo.
Ao
longo desse artigo, abordamos alguns dos conceitos mais importantes do
pensamento de Nietzsche, incluindo sua crítica à moral cristã, sua defesa da
vontade de poder, e sua visão sobre o papel do indivíduo na sociedade. Também
discutimos sua abordagem do conhecimento, da verdade e da realidade, e como ele
se posiciona em relação ao determinismo e ao livre-arbítrio.
Em
conclusão, o pensamento de Nietzsche continua a ser influente e relevante até
hoje, e suas ideias têm sido amplamente discutidas e debatidas por filósofos e
pensadores de todo o mundo. Embora haja muitas interpretações e visões
divergentes sobre sua filosofia, uma coisa é certa: Nietzsche é um pensador que
provoca reflexões profundas e questionamentos sobre o papel do homem na
sociedade e o significado da vida.
Thiago Carvalho
30 de janeiro de 2023
[1] A teologia cristã responde ao pensamento crítico de
Friedrich Nietzsche de várias maneiras. Alguns teólogos argumentam que
Nietzsche não compreendeu plenamente a mensagem cristã e sua natureza
transformadora, e que sua crítica é baseada em premissas equivocadas. Outros
teólogos argumentam que a crítica de Nietzsche à religião cristã pode ser
entendida como uma forma de despertar a reflexão sobre as verdades e valores da
fé cristã, e que a crítica pode ser usada como uma oportunidade para revisitar
e renovar a tradição cristã. Alguns teólogos também argumentam que a religião
cristã não é uma forma de opressão, mas sim uma fonte de liberdade e esperança
para muitas pessoas, e que a crítica de Nietzsche não leva em conta esse
aspecto positivo da fé cristã. De maneira geral, a resposta da teologia cristã
à crítica de Nietzsche é uma combinação de defesa e autocrítica, buscando
equilibrar a fé cristã com a realidade histórica e social, e sempre procurando
renovar e fortalecer a mensagem cristã.
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